Grupos fazem campanha online contra ir às urnas: 'Ninguém me obriga a votar'

Consultor e corretora de imóveis que será mesária no Rio escolhem pagar multa de R$ 3,50 pelo direito de não votar

Grupos fazem campanha online contra ir às urnas: 'Ninguém me obriga a votar'

Sair de casa, enfrentar o trânsito e as filas são sacrifícios que custam muito mais do que R$ 3,50 – valor máximo da multa para os eleitores faltosos que não justificarem o voto até 60 dias depois do segundo turno. Com isso em mente, o consultor Vitor Hotz, de 26 anos, e outros milhares de eleitores engrossam o coro “pago R$ 3,50, mas não voto” na internet, movimento que tomou conta das redes sociais desde os grandes protestos de junho do ano passado.

“É a primeira eleição que decidi fazer isso, antes escolhia um representante ou votava em branco. Neste ano não vou perder tempo indo para a urna. Pago R$ 3,50, mas não voto. Minha vida vai continuar e não participo dessa falcatrua”, disse Hotz, de São Gonçalo (RJ), que em 2013 criou um grupo no Facebook convidando seus amigos a fazer o mesmo. Além do descontentamento com o cenário político atual e a segurança pública, a desconfiança em relação à urna eletrônica e a obrigatoriedade do voto reforçam a escolha dos brasileiros que vão ignorar o dia 5 de outubro, data do primeiro turno das eleições.

Apesar de ter decidido que também não votará, Fernanda Valverde, de 33 anos, não conseguirá descartar completamente a eleição. Convocada para ser mesária há dois anos, ela confessou que cumprirá o papel na zona sul do Rio de Janeiro. “Já que decidi lutar contra a política atual, aceitei novamente a convocação para acompanhar as eleições bem de pertinho. Será um dia que ficarei muito ligada”, afirmou.

Para a corretora de imóveis, que está cheia de “viver nessa republiqueta”, a sociedade está cansada de trabalhar arduamente e só ver novos casos de corrupção impunes. É a primeira vez que Fernanda deixará de escolher um candidato e tenta também atrair família e amigos para o boicote nacional. “Não sou só um corpo bonito, tenho muita mente, visão e sou bem comunicativa. Tenho de debater muito com alguns, pois há muitos zumbis e gente que não sabe nada de política, só futebol e novela.” O mais relutante aos seus discursos, segundo ela, é o próprio pai. “Estamos debatendo, mas chego lá”, disse confiante.

O discurso de Fernanda e Hotz, porém, é considerado extremo para uma parcela dos eleitores nas redes. É comum encontrar, por exemplo, comentários com o tom “eu prefiro continuar lutando pelo meu País” e “eu não desisto do Brasil” nas páginas que defendem o boicote nacional.

Questionado, o consultor subestima as críticas dizendo que é apenas um sintoma da falsa democracia brasileira. “Ninguém deveria me obrigar a votar, deveria ser uma escolha. Eu pago meus impostos, ajudo pessoas necessitadas. Eu já faço muita coisa pelo meu País.” E continua: “Me questiono se essas pessoas que me condenam são as mesmas que olham para a seleção brasileira e enxergam patriotismo.” 

'Boicote as eleições'

Se antes era comum encontrar grupos e eventos nas redes sociais estimulando o voto branco ou nulo como protesto, hoje impera o chamado para boicotar as eleições. O movimento poderia ter adesão nacional considerando que 61% dos eleitores afirmaram que são contra o voto obrigatório, segundo uma pesquisa Datafolha divulgada em maio. A falta de informação(sobre a simbólica multa eleitoral) e um possível medo do Estado, porém, fazem a proposta de abandonar as urnas ser vista como uma ação perigosa.

O eleitor que não respeitar a obrigatoriedade do voto, não justificar e, consequentemente, não pagar a multa de R$ 3,50 fica impedido de participar em concursos públicos, obter empréstimos em instituições financeiras do governo, tirar passaporte ou identidade ou participar de qualquer ato que exija a quitação do Imposto de Renda e serviço militar. E pode ainda ter o título cancelado se não votar ou justificar em três eleições consecutivas. Após o pagamento da taxa, no entanto, a situação é prontamente regularizada.

“Existe ainda muito medo dessa imagem do Estado e muitos não querem virar o eleitor que está em débito com a Justiça Eleitoral. Quando contei o que vou fazer para a minha mãe, ela ficou preocupada por eu ficar fora dos concursos, mas não é assim. Criei o grupo exatamente para explicar aos meus amigos que a multa existe e não significa constrangimento nenhum pagá-la”, defende Hotz. Para ele, se todos soubessem como é “simples e barato” resolver as pendências com a Justiça, ninguém deixaria sua casa para votar.

 


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